Em fase de grandes manobras…
J.-M. Nobre-Correia
Média :
a Global Média decidiu separar-se do Jornal
do Fundão. Personagens mais ou menos encobertos agitam-se há já algum tempo
nos bastidores, perante a espantosa indiferença de quem não deveria sê-lo…
O
texto sobre o Jornal do Fundão aqui
publicado há duas semanas [1],
estava escrito em termos tão feutrés,
tão feutrés (como diriam os
francófonos) que pareceu de facto hermético para boa parte dos leitores. Ou,
pelo menos, muitos não perceberam o que estava por detrás da análise proposta. Vamos
então mais longe…
Como
seria de esperar desde que o Jornal do
Fundão passou a fazer parte de grupos de média nacionais que não tinham
qualquer outra atividade na imprensa regional que se antevia um desfecho assim,
uma inevitável separação. Até porque a informação regional nunca fez parte do
“coração do negócio” desses grupos (Lusomundo, Portugal Telecom, Controlinveste
e Global Média), sendo o Jornal de
Notícias de facto um “diário nacional” publicado na segunda cidade do país.
Porém,
enquanto as vendas e as receitas publicitárias se mantiveram, e os balanços
anuais da empresa não se soldaram por défices, em Lisboa, na administração
central do grupo, ninguém se preocupava seriamente com o Jornal do Fundão. Mas os tempos mudaram e os principais acionistas
do grupo média proprietário também. Pelo que o semanário fundado por António
Paulouro em 1946 foi posto à venda.
Num
primeiro tempo, pessoas houve que, solicitadas, não se mostraram interessadas.
Mas poderes locais há que se agitaram e entraram em ação. Nomeadamente os que
já tinham tirado os cordelinhos para fazer nomear o atual diretor interino. Com
o inconveniente extremamente desagradável de não poderem aparecer como líderes
da operação : isso daria uma imagem muito negativa junto dos leitores e das gentes da
região, com efeitos muito provavelmente negativos em termos de credibilidade e
de vendas.
A dita operação está a ser delineada assim : os
acionista atuais, com uma única exceção, vendem. E há presentemente dois
candidatos à compra : uma residente em França e um residente no Fundão.
Suscitando tais candidatos as habituais interrogações : serão eles os
verdadeiros compradores ?, e com que dinheiro compram e vão poder assumir a
gestão ? A primeira pergunta tem tanto mais razão de ser que há de facto outros
personagens que se agitam na sombra de conveniências diversas. Quanto à
segunda, é preciso não esquecer, por exemplo, que há instituições bancárias
regionais em que interessados na operação ocupam lugares-chave e poderão assim
facilitar o indispensável financiamento.
O certo é que, se a operação se concretizar, o Jornal do Fundão não será mais aquilo
que foi. É verdade que, historicamente, o Jornal
do Fundão foi muita coisa. Mas foi certamente a grande instituição que, nos
anos 1960-70, “pôs o Fundão na mapa de Portugal” : há que render essa homenagem
a António Paulouro, homem de iniciativa e de um extraordinário dinamismo.
Mas
o que há de surpreendente nesta história é a maneira como gente com
responsabilidades no Jornal do Fundão
não viu nem quis ver o futuro há longos anos anunciado. Como surpreendente é a
maneira como os que poderiam e deveriam não ser indiferentes aos destinos de um
jornal importante na região (embora em fase de anemia) preferem ignorar a
situação : mal vão os tempos em termos de cidadania e de implicação das
“elites” na vida da polis !…
[1] Ver a este propósito
J.-M Nobre-Correia, “Em vésperas de vida nova”, in Notas de Circunstância 2, 28 de fevereiro de 2018.
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